sexta-feira, 16 de novembro de 2018

NZZN




Formados em Cascais no ano de 1979, o nome NZZN surge como um acrónimo dos seus três elementos fundadores: Necas (guitarra), Zica (bateria) e Zé Nuno (baixo).
Inicialmente como banda de covers, onde tocavam temas de Van Halen ou AC/DC, os NZZN pronto se dedicaram a tocar material original com a chegada do famoso “boom do rock”, onde surgiu um grande número de novas bandas a tocar rock em Português.
Ficamos com o testemunho do Zica e do Zé Nuno sobre os seus anos nos NZZN.

P. - Zé Nuno, fala-nos um pouco de como nasceu o teu interesse pela música, assim como do teu percurso até chegar aos Aranha.
Zé Nuno – Para mim tudo começou com o entusiasmo pela música que o meu pai me incutiu, ele próprio com um historial musical na sua juventude como saxofonista da banda do Alandroal e que paralelamente à mesma havia também formado, com outros elementos da mesma banda, o conjunto local a que deram o nome de “Os Independentes”. Lembro-me de me marcar tarefas diárias de solfejo, a que eu me tentava esquivar pois achava entediante sem o acompanhamento a partir de um instrumento. Por volta dos meus 13-14 anos comprou-me uma guitarra acústica na Custódio Cardoso Pereira, na altura na Rua do Carmo, onde já trabalhava o nosso amigo Franjas, muito magrinho na altura como, de resto, todos nós.
Por volta dos meus 15 anos, fui alvo do interesse de um vizinho mais velho, que tinha feito parte do Conjunto Mistério (se bem me recordo era este o nome, actuavam todos de mascarilha), o Emanuel, que me pôs a tocar baixo numa guitarra de 5 cordas naquele que viria a ser o meu primeiro concerto: foi no Liceu Charles Le Pierre, perante um público convidado, com temas de Beatles e outras bandas dos anos 60.
Na altura havia um conjunto na Buraca, onde eu morei desde os 5 até cerca dos meus 20 anos, chamado “Os Átomos”, onde tocava o Zé Carrapa (guitarra) e o Falé (baterista). Como eles tiveram de sair do conjunto para cumprir o serviço militar, o manager e dono da banda, Sr. Faia (já falecido), também da Buraca, lançou mão dos jovens teenager que na altura tinham adquirido uma guitarra e lutavam com o instrumento na tentativa de aprender alguma coisa. O baterista era o genro do Faia, o Henrique Knoblick, dono de um irrepreensível rufo de tarola, do qual muito se orgulhava. O reportório era constituído por canções dos Beatles, Joe Cocker, Santana e muitos outros mas tudo em inglês. E, apesar de tocarmos em salas de baile e para baile, tínhamos muito orgulho em não tocarmos nada em brasileiro, espanhol ou outras línguas latinas, canções que considerávamos “foleiras”. Eu era o guitarra solo na altura.
Pelos meus 17 anos surgiu o convite para entrar no “Aranha” como baixista, precisamente por recomendação do baixista deles, o Armando, dado que este iria para Angola por tempo indeterminado.

P. – Os Aranha eram uma banda de covers, que musicas costumavam tocar?
Zé Nuno - Na sua maioria eram covers de grandes bandas de hard-rock da década de 70, designadamente, Deep Purple, Uriah Heep, Black Sabbath, etc.



P. - Zica, fala-nos também um pouco do teu percurso musical antes dos NZZN.
Zica - Formei a minha primeira banda "OS Contrastes" em Campo de OURIQUE nos anos 60 E tocámos covers desse tempo por Lisboa inteira durante cerca de 2 anos. Mais tarde toquei noutras bandas com músicos como o Luís Pedro Fonseca, por exemplo até surgirem a terceira ou quarta formação do Aranha onde vim a conhecer o Zé Nuno, o Necas e o Armindo. Daí nasceram os NZZN.

P. – Em 1979 surgiram os NZZN, como surgiu a ideia de formar a banda, já se conheciam anteriormente?
Zica - Como referi anteriormente conhecemo-nos no Aranha.

P. – Tenho entendido que o vocalista original de NZZN (Tozé), tinha um registo mais “Bon Scott”, tendo o Armindo um registo mais “Ian Gillan”, isto levou a alguma alteração na estruturação das musicas?
Zica - Infelizmente não o fizémos por dificuldade de alteração de tons e sua execução sobretudo na guitarra solo e eu vim seriamente a arrepender-me disso porque, sobretudo no álbum Forte e Feio, alguns temas foram cantados uma oitava abaixo pelo Armindo, coisa que não teria acontecido com o Tozé (que cantava no Abismo e ainda canta no Ténis Bar)

P. – Quais eram as vossas principais influências musicais no início da banda?
Zica - Deep Purple, Scorpions, AC/DC e Van Halen, sobretudo.

P. – Quais as principais dificuldades com que se deparavam naquela altura? Salas de ensaio? Disponibilidade para ensaiar? Falta de material? Ou outras?
Zica - Tínhamos tudo, inclusivamente uma sala de ensaios cedida gratuitamente em Paço d´Arcos.

P. – Para além das músicas dos singles, incluíam covers no vosso reportório? Quais essas covers?
Zica - Não. A partir do momento em que nos assumimos como NZZN, nunca mais tocamos covers.



P. – Sendo o “Shuy de Shock” um tema de autoria do Zica, porque não o incluíam no vosso reportório?
Zica - Já me perguntei várias vezes e talvez tenha sido porque a banda se desmembrou antes de o termos incluído.

P. – Algumas memórias sobre a festa de aniversário do Rock em Stock que queiras partilhar connosco?
Zica - Grande adrenalina, responsabilidade e emoção.

P. – Como era a aderência do público aos vossos shows? Tinham uma base de fãs grande?
Zica - Era muito boa e suponho que tínhamos fãs q.b.

P. – Como foi a vossa tournée como banda de abertura dos UHF durante 1981?
Zica - Ótima. Deu grande projeção à banda.

P. – Chegaram a compartir palco com os Ferro e Fogo ou os Xeque Mate?
Zica - Não calhou.

P. – As vossas letras mantêm-se actuais passados todos estes anos, de onde vos vinha a inspiração?
Zica - De estarmos permanentemente atentos aos acontecimentos quotidianos.

P. – Zé Nuno, o que te levou a abandonar o projecto NZZN mesmo antes de entrarem em estúdio para gravarem o álbum Forte e Feio? Não sentiste necessidade de gravar o álbum?
Zé Nuno - O Necas bebia muito nos concertos e, quando isso acontecia, transformava-se numa pessoa difícil de aturar. Cansei-me dessa situação e, sob o pretexto de recomeçar a minha formação académica, anunciei a saída da banda após um concerto em Vila Franca de Xira (e mais uma dessas penosas bebedeiras do Necas). O facto é que, graças a essas circunstâncias, pude retomar os meus estudos académicos e, na sequência, concluir a licenciatura em engenharia civil, podendo-se dizer ironicamente que o devo ao Necas, pois doutra forma não teria saído da banda e, claro, não teria havido licenciatura.
Não me importei com o álbum porque considerei que tinha atingido o limite máximo admissível da minha paciência, apesar de, na altura em que saí, segundo me recordo, todos os temas do álbum já estarem estruturados, trabalhados e prontos para gravar.



P. – O que acham que correu mal naquela altura para que o projecto não tivesse tido continuidade?
Zica - Problemas internos que ficaram apenas no seio da banda.

P. – Mantêm o contacto entre os antigos elementos da banda hoje em dia?
Zica - Sim mas não tão frequentemente como quando tocávamos, obviamente.

P. – De todas as músicas que gravaram há alguma que considerem a vossa preferida?
Zica - Falo por mim "Brigada Rock".
Zé Nuno – Para mim foram “Vem Daí”, “Trip Fixe”, isto é, basicamente os temas dos dois singles. São também aqueles que gravei e que ficaram com melhor som. O som final do álbum, segundo a minha opinião, não foi muito bem conseguido.

P. – Existe algum concerto que se recordem por alguma razão especial?
Zica - Em Braga com os UHF e os Táxi. Abrimos o concerto, fizemos encore e sentimos grande feedback do público.



P. – Há algumas situações divertidas que tenham vivido e queiram partilhar connosco?
Zica - O Armindo, sempre que íamos jantar antes dos concertos, implicava sempre com as mousses dos restaurantes, afirmando que não eram caseiras.

P. – Passados tantos anos a ideia de ressuscitar os NZZN ainda pairou no ar, o que faltou para que se voltassem a reunir?
Zica - Faltou essencialmente o guitarrista (Necas) e a sua identidade própria.

P. – Zé Nuno, recentemente tens estado envolvido em vários novos projectos tais como os Comandos e os 4Rock, fala-nos um pouco destes novos projectos e ideias para o futuro.
Zé Nuno – Os Comandos surgiram essencialmente como um tributo aos V12, uma excelente banda de metal dos anos 80, com temas fortes e algo complexos. O mentor e cantor da banda é o Rafael Maia, fundador dos V12. A minha continuidade no projecto requeria uma disponibilidade e dedicação que, em determinado momento, considerei que não iria conseguir garantir por muito mais tempo, por razões várias.
Os 4Rock são uma banda de covers de bandas internacionais de rock abrangente de vários estilos e décadas. Recentemente, deparámo-nos com a saída do nosso cantor, o Pedro Silva, pelo que estamos neste momento em fase de audições para preenchimento dessa vaga.
Além de outras iniciativas de projectos inacabados vários, participei também temporariamente num projecto de blues, The Blues Route Band, a convite do Raúl Anjos (ex-baterista dos Go Graal Blues Band). Acabei também por abandonar esse projecto por razões idênticas às que me levaram à saída dos Comandos.
Actualmente estou fortemente empenhado num projecto de tributo às bandas históricas do rock português, os Salada Lusa, estando neste momento na fase de preparação do setlist para arranque previsto em Novembro.

P. – Que principais diferenças encontram entre o panorama actual e os tempos dos NZZN?
Zica - Acabou a abertura e o apetite de gravar novas bandas. De resto está tudo ma mesma.
Zé Nuno - Em primeiro lugar, hoje em dia não é raro encontrarem-se músicos que participam em 4 e 5 bandas em simultâneo (eu próprio já me vi nessa situação e acabei por concluir que é pura perda de tempo). Se por um lado pode ser enriquecedor individualmente pela troca de experiências com músicos variados, por outro é castrante nas possibilidades de sucesso de cada uma dessas bandas pela dispersão de tempo e foco que doutra forma, concentrados numa só banda, possibilitariam atingir os objectivos pretendidos duma forma garantidamente mais célere e segura.
Em segundo lugar, com o desenvolvimento permanente da internet e consequente globalização do conhecimento, os níveis técnicos dos músicos são agora maiores e mais facilmente superáveis, o que por um lado é positivo mas, por outro lado, o que se verifica na realidade é que esse superior nível técnico é geralmente acompanhado, inexplicavelmente, por uma menor criatividade musical.
Em terceiro lugar, e como consequência em parte do que referi no primeiro parágrafo, a dispersão de tempo e foco inibe facilmente duas das condições essenciais para conseguir que qualquer projecto tenha sucesso: ambição e determinação.
Como conclusão e ainda em minha opinião, considero serem cinco as condições essenciais para se alcançar o sucesso com uma banda, quer nos dias de hoje quer na época dos NZZN: sentido de responsabilidade, competência, foco, ambição e determinação.

P. – Existe alguma ideia para efectuar uma compilação que inclua os singles e o LP em CD no futuro, ou por ventura, alguma gravação ao vivo?
Zica - Não.



P. – Sentem que foram pioneiros do heavy metal em Portugal?
Zica - Sinceramente não sei. Mas posso dizer que contribuímos como pudemos.

P. – Como vêm a cena heavy metal actual? Tanto em Portugal como no estrangeiro?
Zica - Em Portugal, sinceramente não acompanho. No estrangeiro se há bandas que insistem a tocar no mesmo padrão, outras continuam a evoluir favoravelmente sobretudo no aspecto técnico.
Zé Nuno – Um dos factores que prejudicam o heavy metal é a ausência frequente de sentido melódico e de dinâmica nas composições do género. As bandas que se preocuparem em superar esse facto com a inclusão de refrões fortes e dinâmicas variadas, e, não menos importante, trabalharem no sentido de conseguirem um bloco coeso, são as que mais facilmente obterão o reconhecimento do público e, portanto, o sucesso.

P. – Algumas palavras que gostassem de acrescentar para terminar esta entrevista?
Zica - Lamento profundamente que em Portugal, apesar da idade, não existam apoios para que possamos continuar a fazer a música que gostaríamos de fazer o que leva muita gente da nossa geração a deixar de tocar.
Zé Nuno - Seria muito importante que os músicos das gerações mais recentes (e não só) se consciencializassem que a música não deve ser encarada de forma leviana ou como um simples hobby que lhes dá o direito de actuarem gratuitamente em bares ou outros palcos públicos só para conseguirem tocar nalgum lado, porque, com isso, estão a viciar o mercado e a “tirar o pão da boca” aos músicos profissionais para quem a música é o seu único sustento. A esse respeito, gostaria de ver a implementação de medidas de fiscalização e penalização adequadas como forma de dissuasão dessas situações aberrantes mas, infelizmente, demasiado frequentes.

Restam-me agradecer desde já o vosso tempo dispensado para esta entrevista e votos de sucesso nos projectos futuros.



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