segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Alarme




Os Alarme formaram-se na Nazaré, e consistiam em Carlos Cavalheiro, voz (ex-Xarhanga), Altino Borda D´Água guitarra, Silvino Pais da Silva guitarra, Orlando Borda D´Água baixo e Victor Bombas bateria. Durante o chamado "Boom do Rock Português", gravaram o single "Desconto Especial", que incluía o tema "Autocarro Diariamente" no lado B. Estivemos à Conversa com Carlos Cavalheiro sobre o que foi a carreira dos Alarme.

P. - Olá Carlos, fale-nos um pouco sobre os tempos dos "Xharanga", como era fazer rock em Portugal em plena época de revolução?

R.: A música Rock em Portugal, antes da Revolução, tinha já muitos seguidores a exemplo do que se passava em praticamente todo o mundo. O nível do nacional-cançonetismo, que imperava em Portugal, deixava muito a desejar em todos os capítulos. Faltava a técnica, o bom gosto, o talento e a novidade. Era enfadonho, primário e desinteressante. Era portanto natural, que face à onda de música fresca e de grande qualidade que nos chegava do estrangeiro houvesse muitos aderentes a essa nova música. Outro aspeto a realçar era o facto de ser irreverente e revolucionária. Cabelos compridos, roupas coloridas e extravagantes para época, completavam um quadro a que muitos gostavam de pertencer, e que se destacava vivamente no seio duma sociedade retrógrada, desajustada dos tempos que se viviam e apregoadora de morais ferrugentas.
Havia portanto um grupo de seguidores da música Rock em franco crescimento. Era aí que se situava o Xarhanga!
Depois da Revolução, e em plena época da mesma, o Rock em Portugal foi completamente marginalizado. Não se enquadrava, segundo alguns cuja opinião se tornou importante na altura, com a revolução que se encontrava em curso. Passámos dum regime que achava que o Rock era um fenómeno barulhento e incivilizado, para outro que achava que o Rock não era algo que servisse ou fosse expressão do “povo”.



P. - Depois dos Xharanga, para além de uma participação no festival da canção, em que outros projectos musicais esteve incluído?

R.: Gravei com o Júlio Pereira o álbum “Bota Fora” e ainda com Júlio Pereira, participei como cantor na peça musical “Liberdade, liberdade”.

P. - Como surgiu a ideia de formar os Alarme? Fale-nos um pouco sobre os primeiros tempos.

R.: Antes do Alarme fiz parte durante alguns anos duma banda de baile chamada “Hiper”, cuja maioria dos elementos eram Angolanos. Guardo grandes e belas memórias dessa banda. Quando o Rock Português começou a tomar forma, eu e dois dos elementos do “Hiper”, Altino Borda D’Água e Orlando Borda D’Água, decidimos formar uma nova banda juntamente com dois outros amigos músicos: Silvino Pais da Silva e Vítor Bombas. Para formar a banda decidimos passar a escrever e ensaiar durante 6 a 8 horas por dia, todos os dias da semana. Depois de seis meses nessa rotina  nasceu o Alarme.



P. - Em Julho de 1981 dá-se o festival Só Rock, realizado em Coimbra, onde participaram grandes nomes do rock nacional e do qual foram vencedores, como decorreu este festival?

R.: Esse Festival foi quiçá a maior manifestação de música Portuguesa que jamais existiu. A própria organização do Festival não esperava a adesão que se seguiu e deparou-se com cerca de 200 bandas concorrentes. Assim nas eliminatórias semanais, foi necessário incluir vinte bandas por fim de semana. Dez bandas aos sábados e outras dez aos domingos, no jardim da Sereia em Coimbra. Em cada semana era selecionada uma banda. As eliminatórias decorreram durante 10 semanas. Por fim, as dez bandas finalistas tocaram no Estádio Municipal de Coimbra, donde emergiu o “Alarme” como vencedor.



P. - Ter vencido o festival valeu-vos a edição do single "Desconto Especial", editado pela Imavox em 82?

R.: Sim, depois de esperarmos um ano, efetuámos uma gravação à pressa. Foi tudo feito no mesmo dia. Não houve nenhum cuidado com a qualidade da gravação e foi óbvio que apenas queriam cumprir a promessa que tinham feito. O melhor mesmo foi o equipamento de som que ganhámos, da marca portuguesa “Furacão” e que também fazia parte do 1º prémio.

P. - Em abril de 1982, tiveram um dos momentos mais altos da vossa carreira ao abrir o espectáculo dos Dr.Feelgood, que memórias guarda desse show?

R.: Na realidade o melhor de tudo era o estado de espírito que se alcançava com o desenrolar do concerto. Recordo-me que no final dos concertos necessitávamos sempre de algum tempo a sós para “regressar à Terra”!



P. - Pouco depois foi a vez de partilharem o palco com as Girlschool e os Rainbow do Ritchie Blackmore, algumas memórias especiais que se lembre deste dia?

R.: Fundamentalmente o facto estarmos a tocar em Cascais, o grande templo dos concertos da época. O extraordinário público e o ambiente incrível, essas foram as grandes memórias desse concerto.

P. - Chegaram a ter conversas com alguma editora com vista à gravação de um álbum?

R.: Não, nunca existiram contactos nesse sentido.

P. - Terá sido a não edição de um álbum que levou ao final da banda, por volta de 1983?

R.: O Alarme não estava fadado para ser uma estrela do Rock mas antes um cometa do Rock. Apareceu, brilhou intensamente e desapareceu.



P. - Depois emigrou para o Canadá, teve algum projeto musical por lá? Conte-nos um pouco sobre esses projetos.

R.: Depois de emigrar para o Canadá, continuei com alguma atividade musical, mas apenas como passatempo. Gravei algumas novas canções e, juntamente com alguns amigos, formámos uma banda que teve algumas atuações em palco.

P. - Por volta de 2009, volta a reunir os Alarme, desta vez fazes-te acompanhar por Abilio Caseiro e Abilio Ferro. Ainda tentaste reunir a formação original, ou tal não foi possível?

R.: Sim, com efeito tentei reunir a formação original mas infelizmente tal não foi possível.

P. - Surge depois o álbum "Estamos Aqui", gravado com esta nova formação, foi um sonho tornado realidade ver estas musicas gravadas em cd?

R.: A ideia foi efectivamente gravar o que nunca tinha sido gravado.



P. - Mas no entanto, os Alarme voltaram a não ter continuidade, em tua opinião a que se deveu?

R.: Haverá certamente muitas razões. Uma delas, penso eu, prende-se com o próprio estilo de música da banda e o conteúdo das letras.

P. - Serão os Alarme são um capítulo encerrado na tua vida hoje em dia?

R.: Penso que sim, que o Alarme é um capítulo encerrado por agora, mas quem sabe, os cometas reaparecem a intervalos que apesar de longos são regulares. J



P. - Algumas considerações finais para terminar a entrevista?

R.: Apenas que fui bafejado pela sorte por ter sido um dos primeiros roqueiros em Portugal, de ter tido o privilégio de ter sido músico e de haver retirado da música uma grande dose de felicidade. Esse valor ficará sempre comigo, mesmo quando eu partir para os dias eternos!

Votos de felicidades para o futuro e muito obrigado pelo tempo dispensado!



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